Marina quer modelo de licenciamento da Foz do Amazonas em obra polêmica de rodovia
A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, quer estender o modelo de licenciamento ambiental da exploração de petróleo na Foz do Amazonas para o projeto da BR-319.
O asfaltamento da rodovia, entre Porto Velho e Manaus, é uma das obras mais delicadas do Novo PAC na região amazônica e tido pelos ambientalistas como perigoso estímulo ao desmatamento ilegal.
Em entrevista à CNN, Marina deixou claro que defenderá a exigência de uma “Avaliação Ambiental Estratégica” para levar adiante o licenciamento da BR-319.
Isso significa que o impacto da obra precisaria ser analisado de forma mais ampla, considerando não só sua influência direta nos trechos por onde passa a rodovia, mas também para os planos do governo como um todo para a Amazônia — por exemplo, os reflexos no Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm).
Há, no entanto, uma consequência prática para os planos do governo com essa abordagem: muito dificilmente a obra teria como ser licenciada, licitada e iniciada ainda no atual mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Trata-se da mesma exigência feita pelo Ibama no pedido de licença da Petrobras para perfuração de um poço no bloco FZA-M-59, na bacia da Foz do Amazonas, em região vista como nova fronteira do petróleo.
Ao negar a licença, no ano passado, o Ibama citou, entre outras justificativas, a necessidade de uma Avaliação Ambiental de Área Sedimentar (AAAS) que englobasse as demais bacias da chamada margem equatorial — faixa marítima que vai do Amapá ao Rio Grande do Norte.
No caso de obras em terra, a Avaliação Ambiental Estratégica tem as mesmas características da AAAS para explorações petrolíferas. São levantamentos bem mais abrangentes — e demorados — do que os estudos de impacto ambiental (EIA-Rima) normalmente exigidos pelo Ibama.
“O problema é o miolo”, disse Marina, referindo-se ao trecho central da BR-319, com cerca de 400 quilômetros de extensão e intrafegável há décadas. As pontas da rodovia — nas proximidades de Porto Velho e de Manaus — são menos sensíveis do ponto de vista ambiental.
“Ali é típico e característico de uma Avaliação Ambiental Estratégica. Você não vai fazer a licença olhando só o empreendimento. Tem que ver toda a área de abrangência: como isso vai repercutir nas terras indígenas, em desmatamento… Qual é a capacidade de essa estrada dar resposta a determinados problemas”, afirmou a ministra.
Segundo ela, uma rodovia com tais características tende a gerar impactos em uma área de pelo menos 30 a 50 quilômetros de cada lado.
“Porque aí surgem estradas vicinais e uma série de fatores. Ali nós temos uma grande quantidade de terras públicas, que ainda não foram destinadas [a terras indígenas ou unidades de conservação], o que cria uma vulnerabilidade para grilagem”.
Estrada-parque
Enquanto isso, o Ministério dos Transportes desenvolveu um projeto para transformar o polêmico asfaltamento da BR-319 em algo sustentável, um modelo de “estrada-parque”.
O projeto envolve iniciativas como controle de entrada e saída dos veículos na rodovia, postos fixos da Polícia Federal e da Polícia Rodoviária Federal ao longo do trajeto, um cinturão de unidades de conservação para conter a grilagem.
Também estão previstas 170 passagens de fauna (a maioria subterrâneas), que permitiriam aos animais ir de um lado ao lado sem atravessar a pista, com redes de proteção na estrada.
Com tudo isso, o ministério acredita que pode evitar mais pressões por desmatamento. Foram abertas conversas diretamente entre o ministro Renan Filho e Marina. As equipes técnicas de ambos estão trabalhando juntas em um grupo recém-criado.
De acordo com relatos feitos à CNN por interlocutores de Renan Filho, ele não pretende abrir divergência com Marina em torno da necessidade de uma Avaliação Ambiental Estratégica, mas manter sempre uma atitude de “cooperação absoluta”.
Marina, por sua vez, enfatizou que não facilitará nem dificultará o processo. “O Ministério do Meio Ambiente não facilita, nem dificulta. Nós até agilizamos, mas com qualidade”, disse a ministra.
“Essa avaliação é que vai dar a resposta. Nós temos um compromisso de desmatamento zero. Nós sabemos que a Amazônia não pode ultrapassar 25% de destruição, sob pena de ela entrar em processo de de savanização, nós sabemos que a Amazônia produz a água que é transformada em vapor e é responsável pelas chuvas da América do Sul.”