APLICAÇÃO TEMPORAL: STJ mantém tese do rol taxativo da ANS para casos anteriores à nova lei
A lei de 2022 que transformou o rol de procedimentos da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) em exemplificativo não pode ser usada para julgar ações anteriores à sua vigência, mesmo nos casos em que o pedido envolve tratamento continuado.
Essa conclusão é da 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça. Por maioria de votos, o colegiado decidiu que, sem exceções, a Lei 14.454/2022 só se aplica nos processos que se embasam em negativas de cobertura ocorridas após 21 de setembro de 2022.
Isso significa que, para processos e recursos por fatos anteriores, ainda vale a posição firmada pela 2ª Seção naquele ano, no sentido de que o rol de procedimentos da ANS é taxativo, mas pode ser mitigado em situações excepcionais.
Isso permitiria ao STJ não aplicar a tese do rol taxativo nos casos anteriores à nova lei, mas que envolvessem tratamentos que ainda estavam em curso quando a norma entrou em vigor.
Prevaleceu o voto divergente do ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, para quem isso é inviável. Nos tratamentos continuados, o paciente só pode pedir o custeio de procedimentos que não estão no rol da ANS se a negativa de cobertura ocorreu a partir da data em que a Lei 14.454/2022 entrou em vigor.
“Deve ser mantida a jurisprudência da 2ª seção que uniformizou a interpretação da legislação da época, devendo incidir ao caso as normas que vigoravam quando da ocorrência dos fatos, podendo a nova lei incidir a partir da vigência aos fatos daí sucedidos”, explicou o magistrado.
Como era e como ficou
Até a edição da Lei 14.454/2022, não havia na legislação uma definição clara sobre a taxatividade do rol da ANS. As operadoras costumavam recusar a cobertura de medicamentos e procedimentos não previstos nessa lista. Cabia, então, ao Judiciário fazer essa definição.
A uniformização só veio em 2022, pela 2ª Seção. A conclusão foi que o rol da ANS é taxativo. Assim, as operadoras não são obrigadas a arcar com procedimentos prescritos pelo médico se no rol já houver alternativa eficaz, efetiva e segura.
Por outro lado, se no rol não houver substituto terapêutico ou se os que estiverem listados se mostrarem ineficazes, o plano de saúde deve arcar com a indicação médica, desde que tenha eficácia comprovada, recomendação com base científica e nunca tiver sido recusada pela ANS.
O julgamento representou uma vitória para as operadoras e levou a uma reação imediata: no dia seguinte, foi protocolado na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 2.033/2022, sancionado como Lei 14.454/2022 em 21 de setembro, após meros três meses.
A partir dali, o rol passou a ser exemplificativo. Assim, a operadora é obrigada a arcar com o tratamento ou medicamento se ele for eficaz a partir de evidências científicas, mesmo se houver na lista da ANS alternativas mais baratas e tão eficazes quanto.
Resultado final
Votaram com o ministro Cueva e formaram a maioria os ministros Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro, João Otávio de Noronha e Isabel Gallotti.
Votaram com a ministra Nancy Andrighi os ministros Humberto Martins e Marco Buzzi.
A divergência na 2ª Seção, embora relevante, foi de fundamentação. Nos três casos julgados, os recursos especiais das operadoras de planos de saúde foram negados, mantendo sua obrigação de arcar com o tratamento recomendado.
Isso significa que, mesmo com a orientação anterior, no sentido de que o rol é taxativo, as condições já indicavam que caberia mesmo às operadoras bancar o que foi recomendado pelo médico.
REsp 2.037.616
REsp 2.038.333
REsp 2.057.897
Por: Danilo Vital- Conjur/ Foto: reprodução