CONTROLE DO MERCADO: Fim dos danos causados por cartel não afasta punição, decide STJ
Para que sejam aplicadas as sanções por formação de cartel, basta que um negócio jurídico tenha potencial para produzir danos concorrenciais. Assim, a não comprovação desses danos ou o fim da ocorrência deles não afasta a punição.
Com essa conclusão, a 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu manter a sanção imposta a duas empresas que formaram um cartel no mercado de televisão a cabo no município de Blumenau (SC), em 2000.
Segundo o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), houve a unificação informal e clandestina de duas empresas, que resultou em domínio de 90% do mercado e danos aos consumidores.
O órgão antitruste impôs multa de R$ 4,1 milhões a ambas as empresas. E a transferência de cotas que formalizaria o negócio acabou rejeitada pela Agência Nacional de Telecomunicações.
Essas empresas, então, foram ao Judiciário contestar a punição do Cade e tiveram sucesso. O Tribunal Regional Federal da 1ª Região afastou a multa por entender que houve cerceamento de defesa.
No STJ, o Cade conseguiu desconstituir esse acórdão e manter a multa. A decisão na 2ª Turma foi tomada por maioria de votos, conforme a posição do relator, ministro Francisco Falcão.
Controle jurisdicional
Há dois motivos que impedem o Poder Judiciário de afastar a condenação imposta pelo Cade, segundo o relator. O primeiro reside no fato de que o controle jurisdicional das decisões do órgão antitruste deve se limitar ao exame da legalidade ou da abusividade delas.
No caso, o TRF-1 entendeu que houve cerceamento de defesa porque as empresas não tiveram acesso aos documentos constantes dos anexos descritos na inicial, apesar de eles não terem sido usados na condenação. Ou seja, o tribunal decretou a nulidade do processo administrativo sem a concreta demonstração de prejuízo.
“Em processo administrativo sancionador, apenas se declara a nulidade de um ato processual quando houver efetiva demonstração de prejuízo à defesa”, destacou o ministro Falcão.
Efeitos cessados
O segundo motivo é que, para afastar a condenação, o TRF-1 observou que os danos causados pelo ato de concentração das duas empresas acabaram cessando no tempo. O tribunal apontou informação do próprio Cade segundo a qual houve aumento do número de operadoras de TV a cabo no mercado, com maior competitividade.
No entanto, esses dados, segundo o ministro Falcão, são de períodos muito posteriores ao ato julgado pelo Cade. E, de qualquer maneira, não poderiam ser considerados para fundamentar a condenação administrativa. Isso porque o artigo 20 da Lei 8.884/1994, vigente à época dos fatos e replicado na lei atual (Lei 12.529/2011), diz que constitui infração contra a ordem econômica ato que possa produzir tais efeitos, ainda que não sejam alcançados.
“A lógica da tutela administrativa do bem jurídico difuso da proteção da concorrência é reprimir o ilícito independentemente dos efeitos do dano”, disse o ministro Falcão.
“Em outras palavras, independentemente do pleno exaurimento dos efeitos materiais lesivos à ordem econômica, tem-se que o pressuposto é de que basta o aperfeiçoamento jurídico do negócio e sua aptidão para produzir efeitos lesivos às relações concorrenciais.”
Pontos omissos
Acompanharam o voto do relator os ministros Humberto Martins, Herman Benjamin e Assusete Magalhães. Abriu a divergência o ministro Mauro Campbell Marques, que identificou omissão do TRF-1 ao julgar o caso, pois faltou analisar vários pontos alegados pelas partes na apelação.
Seu voto foi por devolver o caso para o tribunal, para novo julgamento nos embargos de declaração, com efetiva análise e manifestação sobre os pontos omissos.
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AREsp 2.075.429
Fonte: Conjur/ Foto: reprodução