A 5ª turma do STJ não conheceu de agravo regimental, mantendo condenação por racismo de advogado que publicou post no Facebook negando o holocausto e atacando os judeus. Seguindo voto da ministra Daniela Teixeira, o colegiado decidiu que as publicações “extravasam abusiva e criminosamente os limites de qualquer liberdade de expressão”.
O caso
O homem, que se intitula como filósofo e advogado, publicou, em sua página na internet, entre outras coisas, que os judeus foram perseguidos na Idade Média por haver suspeitas de que eles estariam por trás da Peste Negra.
Além disso, o texto afirmava que o holocausto seria uma mentira usada pelo povo judeu e que levantava suspeitas o fato de que não haveria nenhum caso de contaminação pelo coronavírus em Israel. Por fim, disse que a gripe causada pelo vírus H1N1 teria sido programada por um laboratório controlado por uma famosa família americana de descendência judaica.
O juízo de primeiro grau considerou que teorias revisionistas do holocausto, por si só, não implicam necessariamente em ofensa ou inferiorização do povo judeu, mas apenas na negação de um fato histórico, “assim como há quem negue que o homem foi à Lua”.
Em recurso, o homem foi condenado pelo crime de racismo, após o TRF-5 entender que ele extrapolou os limites da liberdade de expressão.
Contra essa decisão, a defesa pediu a nulidade do recebimento da denúncia, argumentando que o MPF se negou a oferecer um ANPP – Acordo de Não Persecução Penal, embora o réu preenchesse todos os requisitos do CPP.
O MPF entendeu que o homem não fazia jus à celebração do acordo, pois, além de ter negado a prática de conduta criminosa, fez ataques pessoais ao procurador da República responsável pelo oferecimento da denúncia, agindo de forma incompatível com a concessão, apesar de ser conhecedor da norma jurídica, já que seria profissional de Direito.
A 3ª seção do TRF-5, no entanto, negou provimento aos embargos infringentes e de nulidade e manteve a condenação. O homem interpôs recurso especial no STJ.
Ao manter a condenação em decisão monocrática, a ministra Daniela Teixeira considerou que os fatos imputados ao homem se revestem de enorme gravidade. S. Exa. explicou que a Constituição e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos estabelecem a liberdade de manifestação de pensamento e expressão como direito fundamental. Entretanto, a ministra explicou que esse direito não é absoluto.
Na decisão, a ministra afirmou que negar ou minimizar atos da natureza dos imputados, pode contribuir para a perpetuação dessas disparidades e dificultar a implementação de transformações significativas. Diante disso, não conheceu do recurso especial.
Estímulo à intolerância e ao ódio
Ao analisar o agravo regimental da defesa, em sessão da 5ª turma, a ministra Daniela Teixeira reafirmou seu entendimento. Ela destacou que o advogado negou veementemente a prática da conduta criminosa, inclusive em tom de deboche com ataques pessoais ao procurador responsável pelo oferecimento da denúncia.
Segundo a ministra, o direito à liberdade de pensamento e de expressão não é absoluto em nenhuma sociedade democrática.
“Essas publicações extravasam abusiva e criminosamente os limites de qualquer liberdade de expressão. Elas configuram estímulo a intolerância ao ódio. Não merecem a dignidade da proteção constitucional que assegura a liberdade de manifestação do pensamento, da livre expressão, e não podem compreender a tutela de licitude penal.”
Para Daniela, não se pode admitir no âmbito de um país democrático, e de uma Constituição que preza pelo respeito a todas as religiões, que se minimize a importância dos atos de preconceito de religião, raça, cor ou gênero.
Por fim, a ministra considerou que a hipótese atrai a incidência da Súmula 182, que considera inviável o conhecimento do agravo regimental que deixa de atacar os fundamentos da decisão agravada.
A decisão foi unânime.
Processo: REsp 2.134.594
Fonte: Migalhas/ Foto: reprodução