Há tempos discute-se a necessidade de reformulação do currículo do ensino médio. Apesar de ano passado a lei 14.945/24 ter sido promulgada para determinar o aumento progressivo da carga horária mínima anual para 1400 horas regulares, em recente pesquisa elaborada pela REPU (Rede Escola Pública e Universidade), percebe-se que o governo do Estado de São Paulo desobedece à determinação legal, e se recusa a aumentar a carga horária exclusivamente das disciplinas de ciências humanas.
A pesquisa, amplamente veiculada pela imprensa no fim de janeiro, aponta que em cinco anos o currículo do ensino médio das escolas de São Paulo perdeu 35,1% da carga horária destinada a essa área do conhecimento, sendo que, para o ano atual, há um prognóstico de perda de mais 13 horas das aulas destinadas a essas disciplinas. Os dados levantados também apontam que filosofia e sociologia foram as matérias que sofreram maior redução ao longo do tempo, e que em 2025 a disciplina de geografia é a que concentrará a maioria dos cortes. Apesar de muito ter se debatido sobre o tema, o diálogo é comumente reduzido ao âmbito do vestibular e/ou de uma necessidade equiparação ao currículo das escolas particulares. A questão, no entanto, vai muito além da extensão ou amplitude da grade, e deve perpassar necessariamente a gravidade do comprometimento do processo civilizatório, ao tolher pessoas de acessar conhecimentos mínimos sobre como a sociedade se organiza.
Em pesquisa realizada em 2024 pela ONU Mulheres, por exemplo, vê-se que 43% dos entrevistados declararam “conhecer pouca coisa” e 16% “não saber nada” sobre direitos humanos. O nível de desconhecimento é tão grande que o próprio termo é assimilado de forma errada, de modo que 50% dos entrevistados afirmaram que “os direitos humanos não defendem pessoas como eu” e 27% que quem mais se beneficia dos direitos humanos “são bandidos”.
Os números são alarmantes e demonstram como uma grande parcela da população ignora completamente conceitos básicos, como o fato de que o direito à educação, à saúde, à integridade física e a moradia são direitos humanos.
Essa falta de familiaridade sobre questões fundamentais (como a definição correta de esquerda, direita, formas de Estado e governo e direitos e deveres estabelecidos pela Constituição Federal) prejudica não só o desenvolvimento acadêmico dos alunos – que chegam deficitários nos bancos universitários e somente em determinados cursos passam a ter noções de Direito -, como o alcance da própria cidadania.
Isso porque desconhecimento permite a manipulação linguística e até mesmo política desses conceitos, inclusive favorecendo a disseminação de notícias falsas que rapidamente são propagadas a partir das redes sociais. O principal exemplo disso é justamente a ideia de “direitos humanos” são uma espécie de organização ou entidade voltada à exclusiva defesa de pessoas encarceradas. Apesar da ideia ser flagrantemente inverídica, está absolutamente arraigada no senso comum popular.
Nesse contexto, urgente é não só o incremento da carga horária das disciplinas obrigatórias de humanas – na contramão do que está fazendo o governo do Estado de Paulo, portanto – mas a inclusão de noções constitucionais como disciplinas optativas dentro da grade curricular do ensino médio. E tal como se deu com a lei 14.945/24, o resultado deriva da visibilidade alcançada através do debate público.
Fonte: Jenifer Moraes – Doutoranda em Direito Penal pela Universidade de Salamanca. Mestre em Direito Penal pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
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