A atualização da Norma Regulamentadora nº 1 (NR1), que trata das disposições gerais em segurança e saúde no trabalho, representa um novo marco na forma como as empresas devem lidar com a saúde dos seus colaboradores. Entre as mudanças mais relevantes está a inclusão dos riscos psicossociais como categoria de riscos ocupacionais a serem identificados e gerenciados pelos empregadores.
Em um cenário onde as doenças psicológicas têm crescido de forma alarmante — muitas vezes relacionadas às pressões e condições do ambiente corporativo —, o reconhecimento formal desses fatores pela legislação trabalhista é um passo essencial. Isso não apenas legitima um problema que afeta milhares de trabalhadores, como também oferece diretrizes claras para enfrentá-lo com responsabilidade.
Dados exclusivos do Ministério da Previdência Social revelam que o Brasil enfrenta uma crise sem precedentes quando o assunto é a saúde mental dos trabalhadores. Em 2024, 472.328 trabalhadores foram afastados por transtornos mentais, o maior número registrado em pelo menos dez anos. Isso representa um aumento de 68% em relação a 2023, quando foram concedidos 283 mil benefícios pelo mesmo motivo.
Esses afastamentos, motivados por doenças como depressão, transtornos de ansiedade e outros quadros incapacitantes, já representam uma fatia expressiva entre os 3,5 milhões de pedidos de licença médica feitos ao INSS no último ano.
Os dados do INSS também revelam o perfil dos trabalhadores mais impactados: 64% são mulheres, com idade média de 41 anos, e a maioria dos afastamentos está relacionada a quadros de ansiedade e depressão. O tempo médio de afastamento é de três meses, mas há casos em que a licença médica é concedida mais de uma vez no mesmo ano. Curiosamente, doenças como a síndrome de burnout, embora reconhecidas e discutidas no ambiente corporativo, ainda aparecem com números reduzidos (cerca de 4 mil casos em 2024), o que representa a dificuldade no diagnóstico clínico e à subnotificação.
Importante destacar que esse crescimento é reflexo de diversos fatores: a instabilidade do mercado de trabalho, a intensificação das exigências profissionais e os efeitos duradouros da pandemia de Covid-19. E a partir desse cenário grave, o novo texto da NR1 representa um avanço significativo para incorporar a saúde mental como eixo central das diretrizes de segurança no ambiente corporativo.
Isso porque, a partir de agora, empresas de todos os portes passam a ser obrigadas a mapear, identificar e avaliar os riscos psicossociais presentes no ambiente de trabalho. Isso inclui fatores como excesso de demandas, jornadas exaustivas, metas abusivas, assédio moral, falta de apoio da gestão e insegurança no cargo — elementos que afetam diretamente o bem-estar psicológico dos trabalhadores.
Com base nesse diagnóstico, os empregadores devem implementar medidas preventivas e corretivas, promovendo ambientes mais saudáveis e colaborativos. A fiscalização também foi reforçada: empresas que não se adequarem às novas exigências podem ser multadas.
Apesar da urgência do tema, há pedidos por parte do setor produtivo para que o governo prorrogue o prazo de adequação das empresas às novas exigências.
E, acredito que as empresas já deveriam estar preparadas, pois os empregadores já vêm lidando com demandas relacionadas à saúde mental, diversidade, prevenção de danos morais e estruturação de ambientes seguros — temas que já eram pauta nas organizações por força de outras normas e até de decisões judiciais.
Além disso, o Programa de Gerenciamento de Riscos (PGR), que já é um documento obrigatório, precisa apenas ser atualizado com os riscos psicossociais. Ou seja, a nova exigência seria, na prática, uma adaptação do que já deveria existir. O custo, portanto, não seria tão elevado, sobretudo para médias e grandes empresas, que já contam com estrutura técnica.
Já para pequenas e microempresas, o cenário é diferente. É compreensível que empreendedores individuais e empresas com poucos recursos enfrentem dificuldades orçamentárias para adequar seus processos no curto prazo. Nesses casos, uma prorrogação pode ser razoável — desde que não postergue indefinidamente uma mudança necessária.
Contudo, mais do que um custo financeiro, o que se coloca em debate é um desafio cultural. As empresas precisarão rever sua forma de operar, abandonar antigas práticas tóxicas e, acima de tudo, compreender que cuidar da saúde mental dos colaboradores não é apenas uma obrigação legal — é um imperativo ético e estratégico.
A atualização da NR1 marca uma virada histórica no combate às doenças mentais no ambiente de trabalho. Trata-se de uma medida que beneficia tanto empregados quanto empregadores, promovendo ambientes mais saudáveis, produtivos e humanos. Em tempos em que o sofrimento psíquico se intensifica, políticas como essa são não apenas necessárias — são urgentes.
*Carla Z. S. Felgueiras é advogada especialista em Direito do Trabalho e sócia no escritório Montenegro Castelo Advogados Associados

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