A NOVELA DOS RIFS: Uso descontrolado de dados do Coaf abre brecha para abusos, diz Gilmar

A NOVELA DOS RIFS: Uso descontrolado de dados do Coaf abre brecha para abusos, diz Gilmar

O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal, fez um alerta nesta quinta-feira (18/9) sobre os riscos do uso indiscriminado de Relatórios de Inteligência Financeira (RIFs) do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf).

Gilmar falou sobre o tema no evento “O Coaf e a Jurisprudência do STF”, que foi organizado pelo Grupo de Estudos de Lavagem de Dinheiro da Universidade de São Paulo (Geld-USP) e transmitido pela TV ConJur.

O tema central da discussão foi a atual divergência no Judiciário sobre a necessidade de autorização judicial para que o Coaf compartilhe os relatórios a pedido da polícia ou do Ministério Público. Em geral, as comunicações do órgão apontam indícios de lavagem de dinheiro com base em dados bancários, fiscais e patrimoniais, entre outros.

Na visão do ministro, a falta de controle sobre os relatórios abre brecha não apenas para abusos em investigações policiais, mas também para exposição indevida de dados pessoais, um risco que, segundo ele, aumenta conforme avança a tecnologia.

“Com a potência que se tem hoje, em termos informáticos, a exposição das pessoas pode ser ainda mais radical a partir de fatos que, às vezes, podem ser absolutamente corriqueiros. Alguém vende uma casa e faz o depósito daquele dinheiro. É muito fácil fazer a constatação de que aquele valor decorre de uma operação absolutamente regular e não se tem de fazer qualquer outra imputação.”

Gilmar defendeu, em decisão do final de agosto, que os órgãos de persecução penal precisam de aval judicial para pedir os dados, mas o Supremo ainda não tomou decisão definitiva e há divergência entre as duas turmas da corte. O assunto compõe um tema de repercussão geral que, segundo Gilmar, pode ser julgado no início do ano que vem.

O decano do STF ressaltou que o controle judicial não busca atrapalhar investigações, mas evitar o uso indiscriminado das informações do Coaf. “Pode de fato chegar a abusos, a mau uso político”, afirmou Gilmar. “Às vezes as campanhas eleitorais são verdadeiras carnificinas. Imaginem um candidato à reeleição usando do aparato de segurança pública para se apropriar de dados sobre adversários, em suma. São coisas extremamente preocupantes, e às vezes fatais para a disputa política.”

Histórico

O debate sobre o compartilhamento de RIFs começou em 2019, com o julgamento do Tema 990 de repercussão geral do STF. O Plenário decidiu, na ocasião, pela constitucionalidade do compartilhamento espontâneo das informações: havendo indícios de crime, o Coaf e a Receita poderiam remeter os dados, de ofício, ao Ministério Público ou à polícia, desde que o sigilo fosse resguardado em procedimentos formalmente instaurados.

Essa decisão passou a ser questionada quando o caminho da informação se inverteu, ou seja, quando os órgãos de investigação passaram a pedir diretamente os relatórios ao Coaf sem autorização judicial.

Essa prática levou a uma cisão nos tribunais superiores. De um lado, a 3ª Seção do STJ firmou o entendimento de que os RIFs por encomenda são ilegais e causam a nulidade das provas se não houver um crivo judicial prévio. Segundo essa posição, os pedidos de dados sem controle judicial podem levar a práticas abusivas como a pesca probatória.

A divergência se replicou dentro do STF. A 1ª Turma passou a validar o compartilhamento por encomenda, alinhando-se à Procuradoria-Geral da República, com o argumento de que a prática não desrespeita o Tema 990. Em contraste, a 2ª Turma acompanhou o entendimento do STJ em favor da exigência de autorização judicial.

 

Fonte: Conjur / Foto: reprodução

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