É louvável que não só os advogados, mas os juízes estejam sempre atentos à realidade social, proferindo decisões que vão moralizar os institutos processuais do ordenamento jurídico quando necessário ao seu aperfeiçoamento.
Todavia, a pretexto de cumprir seu papel de executor da legislação ordinária, não podem atropelar garantias e prerrogativas da Advocacia em geral, bem como desconsiderar o sistema constitucional e legal como um todo. Neste sentido, a novel Lei nº 14.752/2023, dando nova redação ao artigo 265 do CPP e do CPPM, vinha sendo utilizado, sem levar em conta princípios constitucionais e institucionais básicos dos Advogados.
Na verdade, a redação anterior do CPP proibia o defensor de abandonar o processo, senão por motivo imperioso, comunicando previamente o Magistrado, sob pena de multa de 10 a 100 salários mínimos. No entanto, o Estatuto da Advocacia deixa claro que a responsabilidade por avaliar a conduta de advogados é exclusivamente da OAB.
O abandono, descaso e a desistência do processo é algo comum dentro do Poder Judiciário e pode ocorrer por várias razões e motivos, mas se transformava num problema extremamente crônico que realmente precisava ser moralizado e combatido. Mas a questão era de que forma isso deveria ser feito e que princípios deveriam ser observados e respeitados em sua amplitude?
Esclareço que não se está defendendo aqui o profissional desidioso, negligente, e sim, que a fórmula que vinha sendo aplicada para atingir esse objetivo, prejudicava os bons profissionais, porque a legislação não apresentava meios de defesa recursais e os juízes, com o devido respeito, desrespeitavam princípios inerentes do nosso sistema jurídico vigente.
É preciso lembrar que abandono do processo não é apenas ausência de um ato processual ou a falta a alguma audiência. O abandono da causa é bem mais amplo. Todavia essa interpretação vinha sendo feita casuisticamente e de forma subjetiva, dando margem a grandes injustiças.
Há sem dúvidas, prejuízos no abandono do processo. Tanto ao jurisdicionado, quanto ao Estado. Isso porque, perde-se tempo, meios e dinheiro com novas nomeações, intimações, sem contar com o desamparo dos acusados na seara penal.
Repita-se, no entanto, que sob esse prisma, não se pode negar que uma decisão judicial deve ser balizada de forma objetiva, por princípios do devido processo legal, norteador de todo o sistema jurídico bem como da ampla defesa e do contraditório.
Por outro lado, alguns juízes tinham o entendimento que o defensor ausente, sem justificativa, estaria sujeito à aplicação de uma pena de multa que variava entre 10 (dez) até o limite de 100 (cem) salários mínimos, e como a lei não previa recurso dessa decisão, o advogado ficava impossibilitado de realizar a justificativa de sua ausência.
Ora, a possibilidade de o juiz aplicar uma multa, pela ausência injustificada do defensor, em valor que poderia implicar em sério risco à sua integridade patrimonial, haja vista que tal valor seria futuramente executado pelo ente fazendário, cercearia o próprio exercício livre da advocacia, além de violar diretamente as normas decorrentes dos incisos LIII, LIV e LV do artigo 5º da Constituição da República de 1988.
A par desse polêmico tema, na data de ontem 29/02 a Colenda Turma de Câmaras Criminais Reunidas do TJMT, através de seus nobres Desembargadores, colocado em pauta um recurso, debateram com profundidade tal matéria, que inegavelmente, aqueles que não tiveram a oportunidade de acompanhar tal julgamento deveriam assistir, diante da envergadura dos debates dos componentes daquela Corte, o que sem dúvida, foi uma verdadeira aula.
Sendo assim, o artigo 265 do CPP possuía um critério subjetivo de aplicação, o que criava um risco indevido e desproporcional à prática da advocacia, afrontando as garantias do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, bem como invadia a esfera de competência da OAB. Não havia, portanto, como se admitir que um juiz pudesse aplicar punição a advogado supostamente faltoso, assumindo uma posição de presumida superioridade com relação àquele. Da mesma forma, a multa prevista no antigo art. 265 do CPP se caracterizava como uma violação manifesta ao livre exercício da advocacia, posto que retirava da Ordem dos Advogados do Brasil o dever-poder, personalíssimo, de punir os inscritos em seus quadros.
Sobre a não sujeição disciplinar do advogado em relação ao juiz, cabe lembrar o conteúdo normativo do artigo 6º, caput, do Estatuto da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil (Lei nº 8.906/1994), na realidade, um complemento infraconstitucional ao artigo 133 da Carta Política de 1988, in verbis:
“Art. 6º – Não há hierarquia nem subordinação entre advogados, magistrados e membros do Ministério Público, devendo todos tratar-se com consideração e respeito recíprocos.”
Portanto, essa correção veio em boa hora para resguardar as prerrogativas dos advogados, sobretudo na seara penal, prestigiando a advocacia e permitindo que a eventual punição se dê no âmbito da OAB e não por aplicação sumária de um magistrado.
Vitória da OAB!
* José Ricardo Costa Marques Corbelino é advogado em Cuiabá.

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