Pix e outras fraudes digitais: Justiça tem isentado bancos em muitos casos de golpes

Pix e outras fraudes digitais: Justiça tem isentado bancos em muitos casos de golpes

Decisões judiciais têm apontado que instituições financeiras não são obrigadas a ressarcir vítimas de golpes digitais se não houver falha no serviço. Especialista explica como ocorrem as fraudes e quais cuidados adotar

 

Com o aumento das fraudes digitais, especialmente aquelas que envolvem transferências via Pix, o Judiciário tem tomado uma posição mais cautelosa ao avaliar a responsabilidade dos bancos. Segundo o advogado Stefano Ribeiro Ferri, especialista em Direito do Consumidor, já há entendimentos que isentam as instituições financeiras de reembolsar vítimas de golpes em situações nas quais não houve falha bancária.

 

“Há jurisprudência consolidada em diversos tribunais indicando que os bancos não têm o dever de ressarcir o consumidor quando não há falha na prestação do serviço bancário. Isso ocorre, por exemplo, em golpes nos quais o consumidor age por conta própria ao transferir valores via Pix após ser enganado por meio de contatos telefônicos, mensagens falsas, ou propostas enganosas. Em situações em que o banco não poderia prever ou impedir a operação”, afirma Ferri.

 

Golpes como do falso emprego e por engenharia social, por exemplo, que estão entre os mais comuns. “O criminoso oferece uma vaga de trabalho, normalmente em aplicativos de mensagem, e convence a vítima a fazer ‘testes’ ou pagar taxas para garantir a contratação. Em alguns casos, cria-se um ambiente com tarefas repetitivas e falsas promessas de retorno financeiro rápido”.

 

Outro método comum envolve a manipulação emocional e psicológica da vítima. “O criminoso se passa por alguém de confiança, como um parente, amigo, empresa ou até funcionário do banco, para induzir a vítima a fazer uma transferência via Pix. O golpe pode incluir ligações, cliques em links falsos, sites idênticos ao de empresas conhecidas, entre outras formas de manipulação psicológica”, alerta o advogado

 

Ferri cita uma decisão recente do seu escritório, no qual o Tribunal de Justiça de São Paulo reforçou o entendimento da culpa exclusiva da vítima isentando seu cliente. O autor transferiu voluntariamente diversas quantias por Pix e, posteriormente, alegou falha de segurança dos bancos.

“A Justiça, no entanto, negou o pedido, afirmando que as instituições bancárias não têm a obrigação de tutelar seus clientes em toda e qualquer operação, ainda mais quando realizada pelo próprio titular da conta”, explica o advogado.

 

Código de Defesa do Consumidor

Essas decisões judiciais não violam o Código de Defesa do Consumidor, segundo o especialista, mas demonstram uma outra análise da responsabilidade prevista na lei. “Essas decisões não necessariamente contrariam o CDC, mas representam uma interpretação mais restritiva da responsabilidade objetiva prevista no artigo 14. O entendimento majoritário é que a responsabilidade do banco exige falha na segurança ou inadequação do serviço prestado”, informa o advogado.

 

Por isso, o consumidor precisa estar muito atento ao clicar em links ou atender supostas ligações que seriam provenientes de seu banco, porque o ônus da prova tem recaído sobre o consumidor.

 

“Ele deve demonstrar que houve negligência, omissão, falta de segurança ou ausência de mecanismos de controle por parte da instituição financeira. Isso pode incluir, por exemplo, a não detecção de comportamento atípico na conta, falhas de autenticação ou ausência de confirmação em transações de alto valor.”

 

O advogado afirma que esse entendimento busca evitar um colapso no sistema financeiro, mas alerta para os riscos. “Essas decisões representam uma tendência de delimitação da responsabilidade dos bancos diante do avanço dos golpes digitais. Em parte, isso visa evitar um efeito sistêmico no setor financeiro, onde as instituições poderiam ser responsabilizadas por atos que ocorrem fora do seu alcance de controle”, diz Ferri.

 

Contudo, há um sinal de alerta no caminho. “Esse entendimento pode enfraquecer a confiança do consumidor, que já se vê vulnerável diante de golpes sofisticados. Ao mesmo tempo, o Judiciário busca equilibrar a autonomia do cliente nas operações bancárias digitais com o dever de segurança dos bancos”.

 

Quando indenizar

Há casos em que o Judiciário reconhece o dever de indenizar. O Judiciário costuma reconhecer o dever de ressarcir o consumidor quando existem falhas de segurança bancária, como clonagem de cartão ou vazamento de dados, por exemplo, cita o especialista.

“Quando o banco deixa de alertar ou de bloquear operações atípicas e incompatíveis com o histórico do cliente; o golpe envolve fraude sistêmica ou uso indevido da estrutura do banco, como invasão de conta, simulação de páginas do próprio banco ou falha no sistema de autenticação; o consumidor é vulnerável notório (idosos, pessoas com deficiência, analfabetos digitais) e o banco se omite diante disso”, acrescenta o advogado.

 

Dicas para não cair em armadilhas digitais

>Desconfie de ofertas muito vantajosas ou que exigem pagamentos antecipados para vagas de emprego

>Nunca clicar em links enviados por desconhecidos ou fora de canais oficiais

>Confirme ligações e mensagens com a fonte original (ex: ligar para o banco por outro número)

>Ative a autenticação em dois fatores nos aplicativos bancários

>Limite valores para transações via Pix, especialmente no período noturno.

>Evite repassar dados pessoais por telefone ou mensagem, mesmo que a pessoa pareça confiável

>Cadastre chaves Pix apenas diretamente no app do banco e jamais por terceiros

 

Fonte: Stefano Ribeiro Ferri – Especialista em Direito do Consumidor. Assessor da 6ªTurma do Tribunal de Ética da OAB/SP. Membro da comissão de Direito Civil da OAB –Campinas. Formado em direito pela Fundação Armando Alvares Penteado (FAAP)

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