DEVAGAR COM O ANDOR: Trump só pode impor tarifa em caso de emergência nacional

DEVAGAR COM O ANDOR Trump só pode impor tarifa em caso de emergência nacional

A chantagem do presidente Donald Trump de impor tarifas de 50% às importações de produtos brasileiros se baseia em fundamentos jurídicos que já estão em disputa na Justiça Federal dos Estados Unidos.

O Tribunal de Comércio Internacional dos EUA (CIT — US Court of International Trade) e um tribunal federal em Washington, D.C. emitiram liminares que proíbem, temporariamente, o governo Trump de aplicar a medida executiva.

Um tribunal federal de recursos suspendeu as liminares até que uma audiência seja feita em 31 de julho, para as partes discutirem a ação movida por estados e organizações empresariais dos EUA.

Porém, especialistas entrevistados pela emissora de televisão CNBC, consideram “indefensável” a ameaça do governo Trump de impor um tarifaço ao Brasil e a outros países — entre eles a China, Canadá e México — principalmente por razões políticas.

O Tribunal de Comércio Internacional concluiu que o poder reivindicado por Trump para impor tais tarifas “excede qualquer autoridade tarifária”. O tribunal federal em Washington argumentou que a lei invocada por Trump não se aplica ao caso.

A “Lei de Poderes Econômicos de Emergência” (Ieepa — International Emergency Economic Powers Act), trata de tarifas recíprocas destinadas a eliminar déficits comerciais do país. Ela confere ao presidente “poderes econômicos de emergência, para lidar com certas ameaças estrangeiras aos Estados Unidos”.

Mas proíbe a imposição de tarifas por razões políticas. E não pode ser usada como arma para alavancar negociações políticas com governos estrangeiros. O Legal Information Institute (LII) explica o que estabelece o “50 U.S. Code § 1701”:

“(a) Qualquer autoridade concedida ao presidente pela seção 1.702 deste título pode ser exercida para lidar com qualquer ameaça incomum e extraordinária, que tenha sua origem total ou substancialmente fora dos Estados Unidos, à segurança nacional, à política externa ou à economia dos Estados Unidos, se o presidente declarar uma emergência nacional com relação a tal ameaça.”

“(b) As autoridades conferidas ao presidente pela seção 1.702 deste título somente poderão ser exercidas para lidar com uma ameaça incomum e extraordinária em relação à qual tenha sido declarada emergência nacional para os fins deste capítulo, e não poderão ser exercidas para qualquer outro propósito. Qualquer exercício dessas autoridades para lidar com qualquer nova ameaça deverá ser baseado em uma nova declaração de emergência nacional, que deverá ser referente a tal ameaça.”

No caso do Canadá e México, Trump defende o aumento das tarifas com o argumento de que os dois países não estão fazendo o esforço necessário para conter a imigração ilegal e o tráfico de entorpecentes. No caso da China, a razão seria a de que o país não está contendo o tráfico de fentanil.

No caso do Brasil, como foi amplamente divulgado, a principal razão seria o fato de o país estar processando o ex-presidente Bolsonaro, seu aliado político, que tentou um golpe militar para reverter o resultado das eleições que perdeu para Lula. A razão de que seria necessário equilibrar a balança comercial é falsa, como se sabe.

O Brasil não é citado nas ações movidas contra o governo Trump, com o objetivo de bloquear a aplicação do decreto que lançou a guerra tarifária. Mas, o caso certamente irá exercer um impacto direto na audiência de sustentação oral de 31 de julho, porque irá erodir ainda mais a credibilidade do governo Trump, disseram especialistas consultados pela CNBC.

O professor de direito Ilya Somin, que representa os peticionários, declarou que, apesar de o Brasil não estar envolvido nas ações, a carta enviada por Trump ao presidente Lula “expõe ainda mais a natureza indefensável da alegação do governo de que o presidente tem, virtualmente, uma discricionariedade sobre tarifas que não está sujeita à revisão judicial”.

Muitas petições de amicus curiae foram protocoladas no Tribunal Federal de Recursos — entre elas, uma petição assinada por quase 200 parlamentares democratas. Os congressistas argumentam que a lei invocada por Trump, a Ieepa, “não garante autoridade ao presidente para impor tarifas em qualquer cenário”.

Brasil

No que se refere especificamente ao Brasil, dois senadores democratas saíram em defesa do país.

O senador Tim Kaine, de Virgínia, declarou: “A carta de Trump anunciando a imposição de tarifas ao Brasil leva o abuso de poder a um patamar totalmente novo”. O senador prometeu usar “todos os meios necessários para bloquear essas tarifas matadoras de emprego”.

O senador Ron Wyden de Oregon, principal democrata no Comitê de Finanças do Senado, acusou Trump de tentar “sacrificar a economia para acertar contas pessoais com o governo do Brasil, o que está totalmente fora de sua autoridade legal”.

O jornal The Washington Post destacou que Trump tem usado o comércio como instrumento para obter concessões de países menores — tais como o Vietnã e a Colômbia. “Porém o Brasil, seu mais novo alvo tarifário, é um adversário muito mais formidável, segundo analistas, e tem menor probabilidade de ceder à pressão de Washington.”

Para o jornal, a ameaça de Trump ao Brasil é um tiro que vai sair pela culatra. O Brasil não vai se acovardar e isso só vai melhorar a posição de Lula nas pesquisas eleitorais, se ele e Bolsonaro voltarem a se enfrentar nas próximas eleições presidenciais.

Essa influência já se manifestou em duas campanhas eleitorais. No Canadá, o primeiro-ministro Mark Carney e seu Partido Liberal reverteram um déficit de 20 pontos nas pesquisas eleitorais, em grande parte devido à resistência às ameaças tarifárias de Trump e à declaração de que queria anexar o Canadá aos EUA.

Na Austrália, o candidato conservador a primeiro-ministro perdeu muitos pontos nas pesquisas de opinião pública, por se curvar diante de Trump, desde a primeira rodada da guerra tarifária mundial. E, no final das contas, sofreu uma derrota avassaladora nas eleições. Com informações adicionais da CNBCThe Washington Post e outras publicações.

 

Consultor Jurídico nos Estados Unidos./ Foto: reprodução

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